A advogada Milene Serrat Brito dos Santos foi obrigada a se submeter à revista íntima para poder atender um cliente detido no Centro de Triagem de Marambaia, em Belém (PA).
Foto Reprodução |
O caso ocorreu nesta terça-feira (11/2), segundo o boletim de ocorrência registrado na Divisão de Crimes Funcionais da Corregedoria da Polícia Civil.
De acordo com o documento, ao entrar no presídio, a advogada foi informada de que deveria ser revistada com base na Portaria nº 164/20, da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária do estado. A norma foi editada em 10 de fevereiro deste ano, há apenas dois dias.
O artigo 5º da portaria determina que o advogado seja "submetido a todos os procedimentos rotineiros de revista, os quais já são realizados, indistintamente, em todas as autoridades".
De acordo com o B.O., a advogada "não concordou com o procedimento, entretanto, dada a necessidade de entrevistar seu cliente, que não possui parentes na Cidade de Belém, tendo em vista que o mesmo reside em São Sebastião da Boa Vista, falou que iria se submeter à revista".
Uma agente penitenciária a acompanhou até o banheiro. A mulher teve que abaixar a calça até a região do joelho e levantar a blusa. Ao sair do local, prossegue o documento, foi informada de que todos os advogados terão que passar por revista por determinação do Superintendente do Sistema Penitenciário do Estado do Pará (Susipe), Jarbas Vasconcelos do Carmo.
Entrevista reservada
Ainda de acordo com o relato, a advogada não pôde falar reservadamente com o seu cliente, o que viola as prerrogativas da advocacia. Durante a entrevista, agentes permaneceram na porta, que ficou aberta durante toda a conversa.
A garantia de entrevista reservada consta no artigo 7º, III, do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94). De acordo com a norma, é direito do advogado "comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis".
A própria portaria usada para obrigar que a advogada fizesse a revista íntima garante o direito a entrevistas reservadas.
Segundo o artigo 1º, I, do regramento, "os advogados terão acesso às Unidades Prisionais para realização de entrevistas reservada e pessoal com seus clientes, mediante apresentação da carteira de identidade expedida pela Ordem dos Advogados do Brasil e mediante agendamento eletrônico".
Para a constitucionalista Vera Chemin, a portaria contém vícios de ilegalidade flagrantes.
"Com relação à revista íntima de advogado como condição para sua entrada no estabelecimento prisional, o artigo 7, inciso IV, alínea "b", da Lei 8.906/94, prevê claramente que o advogado pode ingressar livremente nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios de justiça, serviços notariais e de registro, e, no caso de delegacias e prisões, mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares", afirma.
Ainda de acordo com ela, a revista pessoal e íntima afronta o princípio da legalidade e da proporcionalidade. Sendo assim, prossegue, "a referida portaria contém ilegalidades do ponto de vista material e necessita ser questionada pela via legal competente para declarar a nulidade de alguns de seus dispositivos e corrigir a sua redação, de modo a atender aos diplomas legais e à Constituição Estadual e, por óbvio, Federal”.
Afronta às mulheres
Em nota, a Comissão da Mulher Advogada e de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia da OAB repudiou o acontecimento.
A comissão disse "que a violência suportada pela advogada na entrada do presídio é uma afronta a todas as mulheres advogadas do Brasil".
"O Conselho Federal da OAB estará ao lado da advogada Milene Serrat na defesa intransigente de sua dignidade e prerrogativas profissionais. É direito da advogada entrevistar-se com o seu cliente, ainda que encarcerado.
Reforma a OAB que as medidas de segurança precisam respeitar a dignidade humana e profissional da advogada. Os princípios da segurança e da dignidade, ponderados, não admitem e não toleram atitudes autoritárias e vexatórias praticadas pelas autoridades carcerárias brasileiras", prossegue a entidade.
Por: Redação/Conjur
0 Comentários